Sobrevivi ao backstage. E voltei com histórias.
Notas de quem sobreviveu a bastidores, semanas de moda e caixas de mudança intermináveis.
Se esta newsletter chegou até você, é porque eu sobrevivi — não só à minha mudança de apartamento, mas também à São Paulo Fashion Week. Um pouco torta, talvez. Levemente desequilibrada entre caixas. Mas viva.
Como se não bastasse, a Crème também participou da sua primeira cobertura de backstage (!!!) — com chão de areia, som de paredão e uma Tieta repaginada cruzando a passarela.
No meio desse roteiro não linear dos últimos dias, ainda consegui acompanhar de longe os highlights da Milan Design Week — e alimentar minhas obsessões mais recentes: agora, num mood de mudança de apartamento, divididas entre móveis vintage, canecas lindas e o charme do design escandinavo.
Não prometo epifanias. Mas talvez, entre um desfile e uma referência de design e outra, você encontre algo que também dê vontade de guardar.
– Junia Lopez
Há uma energia particular nos bastidores de um desfile. É a correria para todos os lados, o som de zíperes sendo fechados às pressas, jornalistas disputando pole position, assistentes correndo para todos os lados — e modelos, plácidos, esperando serem belos. Tudo acontece ao mesmo tempo.
Foi nesse cenário que a Crème fez sua estreia oficial cobrindo um backstage. E não poderia ter sido mais emblemático: Misci Verão 2026. Uma coleção que transforma Tieta, de Jorge Amado, em narrativa viva, misturando o Brasil solar e sensual.
Durante o ensaio, as instruções para os modelos soavam claras e ditavam o tom: "Gente, mais quente, mais força, mais sensual."
A sensação era de estar dentro de uma bolha que ameaçava estourar a qualquer momento: flashes ansiosos, produção ajeitando as barras das peças como se estivessem salvando vidas — porque é assim que backstage funciona: entre o desespero e a fé de que, na passarela, tudo parecerá fácil e glamouroso.
E foi exatamente assim que a Crème atravessou seu primeiro backstage. Não saiu ilesa — mas saiu mais viva, mais atenta, e com a certeza de que o crème de lá crème está no que a câmeras não conseguem clicar.
Tieta voltou. Mas não como nos contaram.
Na passarela da Misci, ela renasce com a mesma sensualidade agrestina — só que vestida por um design utilitário e sofisticado.
O desfile costura tempos e geografias: botas tratoradas urbanas (assinadas por Paula Torres) pisam firme ao lado de bordados delicados feitos pelas artesãs da Casa das Bordadeiras de Timbaúba dos Batistas e pelas rendeiras de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte. O chão é de areia, o som é de paredão, mas o visual é elevado, pensado em camadas e recortes que desafiam o óbvio.
A cartela de cores do styling, assinado por Renata Corrêa, também não pede licença: azul bebê encontra vermelho vibrante em conjuntos masculinos desconstruídos; rosa bebê e marrom claro flertam entre si. O marrom, onipresente, parece absorver o pó da estrada nordestina. Entre recortes e sobreposições, surgem ainda animal prints nada óbvios — com espécies nativas brasileiras.
Em meio a estampas que evocam o sertão — como as criadas pelo artista Elian Almeida — aparecem camisas abertas, decotadas e coloridas: uma homenagem irônica e amorosa ao estilo masculino das pequenas cidades interioranas. Recortes, experimentações e aquele joguinho em que o chique e o brega se esfregam até não dar mais para separar um do outro.
Bom gosto aqui não é neutro. Nem comportado. Ele é suado, sensual, vibrante e deliciosamente escandaloso.
Como ela. Como Tieta.
Minha semana foi um mix de caça ao secador de cabelo (dramas de quem tem franjinha) e garimpo de looks entre caixas e mais caixas, tentando encontrar algo digno da maratona SPFW. No meio do caos da mudança, dois desfiles brilharam o meu olhar na temporada:
À La Garçonne
A nova coleção da À La Garçonne foi inteira construída com tecidos de arquivo e deadstock, o que, por si só, já é um posicionamento. Aqui, a alfaiataria se arma com silhuetas ampulheta, xadrezes intensos e vestidos corsetados que não têm medo de chamar atenção. Jaquetas com pelo, casacos pesados, renda meio lingerie. Um inverno de peso!
E um detalhe que ganhou meu coração: a forma como os modelos carregavam suas bolsas na passarela.
PIET
Gramado, arquibancada, trilha ao vivo de Marcelo D2 ecoando nas estruturas do Pacaembu. Um desfile que parecia mais final de campeonato — só que com styling pensado e collabs de peso (Levi’s, Puma, KidSuper) para selar o contrato.
Pedro Andrade não está mais jogando o mesmo jogo — e o streetwear que ele apresenta também não. Bermuda sobre calça (sim, eu acertei no look), óculos Oakley, chuteiras decoradas e referências que confirmam: o esporte está mesmo mais em alta do que a moda.
A Milan Design Week caiu como uma luva de refs. Separei meus highlights preferidos e que mais me inspiraram:
Georg Jensen
No Spazio Maiocchi, a Georg Jensen montou a Gelateria Danese — um café pop-up onde sorvete escandinavo e café artesanal dividem a cena com uma coleção nova de objetos em prata esterlina.
Um lembrete de que até o momento mais mundano pode ser elevado... com prata e um fiordilatte delicioso, rs.
Loewe
Nada de moda: a Loewe apresentou uma exposição com bules (sim, bules) assinados por 25 artistas e designers internacionais. Cerâmica, couro, latão, barro da Galícia… Como sempre, a marca transformou o banal em objeto de desejo.
Kasthall & Astrid Textiles
Inspirada em uma aquarela de 1991, a instalação Anemon in Spring (em parceria com o Studio Between) trouxe cores lavadas, texturas orgânicas e um ritmo que lembra o da própria primavera escandinava.
Loro Piana & Dimoremilano
Dois gigantes do luxo italiano, Loro Piana e Dimoremilano, se uniram pela primeira vez para apresentar La Prima Notte di Quiete, uma instalação que parecia saída de um filme antigo. O projeto misturou design de interiores com narrativa cinematográfica, criando uma experiência imersiva.
Prada Frames
Curado pelo estúdio Formafantasma, In Transit, como o nome sugere, aconteceu literalmente em trânsito: a bordo do trem Arlecchino, restaurado pela Fondazione FS Italiane, e no Padiglione Reale, em Milão.
Miu Miu Literary Club
No meio do caos milanês, a Miu Miu fez o oposto: desacelerou.
O Miu Miu Literary Club, instalado no Circolo Filologico Milanese, com curadoria de Claire Distenfeld, foi uma maneira da Maison reafirmar que intelecto também é luxo.
Seguindo o espírito desta edição, a minha Creamy Wishlist traz achados para a minha nova casa e uma preciosidade que saiu diretamente das passarelas:
- A bota em collab com a Paula Torres, desfilada no Verão 26 da Misci
- Este espelho charmoso da Ad Astra
- Sonhando com este sofá no meu apartamento novo
- Saboneteira que quero usar como bandejinha para o banheiro
- Vela de uma das minhas marcas favoritas de perfume
Na temática, o Hidden Gems desta edição é uma seleção de curadores de garimpos de móveis, objetos de design e itens para a casa (você encontra todos via Instagram):
Tapilogie – Curadoria impecável de tapetes garimpados chiquíssimos.
Quina Mobilia - Mobília com curadoria afiada (tem espaço físico em São Paulo)
Outofuseberlin - Antiquário e peças vintages belíssimas selecionadas por dois curadores super descolados (e que também valem o seu follow)
Recondicionar - Seleção de móveis vintages e design brasileiro modernista
Antônio Casa - Perfeito para garimpar itens de decoração.
Mobiliun - Garimpo de móveis especiais e de muito bom gosto
Como sempre , uma delícia de leitura!
bom demais ler essa menina!!!